01 de maio de 1920
Eu estive tão infeliz por toda à noite! Eu te enviei um telegrama pra te dizer o quanto eu me sinto machucada e chocada...Porque tu tens que dar importância à tudo o que é secundário e insignificante,deixando completamente de lado o essencial? Tu te comportas como alguém que se esforça de não ser mordido por um cão, quando um tigre se prepara à devorá-lo.Tu passas teu tempo refugiando-te em subterfúgios - sim,eu sei, eu fui sem dúvida alguma estúpida de me colerisar,porque tu escapastes para ir ver à Clemence Dane, mas de igual modo isso me parece estraordinariamente perverso de tua parte de continuar à visitar-la anualmente,depois de tudo que eu te disse sobre ela, outra manhã. Esperei vagamente que,talvez tu percebas a imensidão da minha tristeza;ah! sim, durante todo esse tempo,tu me escondias alguma coisa - um vilão segredinho, furtivo e desprezível -, Enfim,que importa! Como eu já dizia ainda esta noite à Denis : não tive êxito em ser leal tanto contigo que com ele.Mitya, tu não vês em que direção estamos indo?, Eu me sinto tão sozinha nessa clareza de visão que me aterroriza!...Ah! porque não posso te sacudir até te arrancar dessa tua apatia,esta apatia que cresce em ti como uma espécie de champignon insidioso? Que aconteceu à nosso amor? Um vil amalgama,mutilado e subserviente,de prazeres fustivos e de falsas generosidades,de impulsões medíocres,e de esperas famélicas.Mas,à meu ver,o pior é a a flagrante e esmagadora hipocrisia. Se dissimulando na nossa astuta perversão (e não somente à nossa,mas também das pessoas que nos cercam),a covardia torna-se prudência,o egoísmo da ternura, e os covardes enganadores vangloriam-se de serem "bons",de tal maneira que a falta de dignidade, a cegueira e o ciúme não são mais que de manifestações diversas do "amor".
Nenhum comentário:
Postar um comentário